Cláusulas que devem constar em qualquer contrato particular
Advogado empresarial relaciona a importância das cláusulas contratuais
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Wander Barbosa – Advogado Empresarial
Abril/2025
Quais as consequências de um Contrato Incompleto?
Recebemos, rotineiramente, solicitações de clientes buscando meios de se executar determinado contrato ou defender-se em razão de suposto descumprimento, intentado pela parte no qual se contratou, visto tratar-se de uma banca voltada a consultoria empresarial.
São os mais diversos tipos de negócios jurídicos. Desde contratos simples, tais como os contratos de locação, sejam contratos de venda de bens móveis e imóveis, de serviços e uma outra infinidade de objetos transacionados de alguma forma, onde os contratantes buscam, por meio de um contrato, garantir que a outra parte cumpra com sua obrigação tal como se ajustou preliminarmente.
Contudo, o que podemos observar em ampla maioria, são obrigações cumpridas parcialmente ou descumpridas em razão de ausência de previsão contratual frente a determinados fatos que sobrevieram e não foram previstos no contrato.
Ocorre que, muitos deles são obtidos por meio de modelos prontos, baixados da internet e adaptados ao negócio que se realiza, sem, entretanto, se cercarem das especificidades daquele negócio ou das próprias partes contratantes e que tornam a atividade do advogado de direito empresarial sobremaneira desafiadora.
Dito isso, as ações judiciais propostas com objetivo de se executar determinada quantia ou impor a parte contrária a obrigação de fazer ou deixar de fazer algo, decorrente de um contrato, por vezes, tornam-se controvertidas, demandando desnecessário e demasiado tempo com trâmites processuais (exaurimento probatório) até que sobrevenha uma sentença judicial que estabeleça os limites de direitos e obrigações de cada parte.
Evidentemente, uma obrigação contratual descumprida pode exigir anos de espera para que efetivamente ocorra, ocasionando prejuízos de tempo e valores não desejados no início da contratação.
Entretanto, as questões contratuais controvertidas poderiam, facilmente, serem dirimidas por meio de cláusulas contratuais claras, coerentes, antevendo possíveis e prováveis acontecimentos futuros que darão as partes contratantes, o correto direcionamento.
Para que isso ocorra, todavia, é inegável que o contrato deve conter determinadas cláusulas que considero obrigatórios em qualquer tipo de negócio, protegendo ambos os contratantes e estabelecendo as consequências diante de cada fato jurídico ocorrido após a contratação.
Qual o modelo de contrato completo?
Evidentemente, nenhum modelo de contrato poderá ser utilizado como absoluto para qualquer tipo de negócio, de forma que, contratar um advogado especialista em contratos é imprescindível.
Todavia, seja qual for o nível de complexidade de cada contrato, determinadas cláusulas não podem, sob qualquer pretexto, ficarem fora de quaisquer deles, razão pela qual, convido-o a examinar cuidadosamente este documento de forma a permitir-lhe refletir se o contrato que lhe entregaram para assinar ou aquele elaborado por você, contém os dispositivos que regulam as possíveis e inevitáveis controvérsias futuras.
A efetividade dos negócios jurídicos repousa sobre a clareza, a completude e a segurança das cláusulas contratuais. A autonomia privada (art. 421 do Código Civil) encontra limite na função social do contrato e na boa‑fé objetiva (art. 422), exigindo que os pactos sejam estruturados com disposições suficientes para reger todo o ciclo contratual — formação, execução, adimplemento e extinção.
Isso posto, inicio expondo a importância de se inaugurar o contrato, antes mesmo da qualificação, de uma completa exposição de motivos, ou seja, evidenciando a situação atual, como o serviço ou produto foi ofertado, o desejo de cada uma das partes e as razões pela qual se decidiram por elaborar este contrato, bem como, o que esperam as partes o que aconteça quando integralmente cumprido.
Novamente, a depender da complexidade, não se aventure a economizar neste momento. Esta decisão e falsa economia neste momento, poderá ser traduzida em prejuízos expressivos acaso a execução do contrato não se dê como planejado e desejado, de forma que, a contratação de um advogado empresarial ou contratual é de vital importância.
Quadro‑síntese das cláusulas que não devem faltar
- Qualificação das Partes
Todo instrumento contratual deve iniciar‑se com a identificação minuciosa dos contratantes, indicando nome completo, nacionalidade, estado civil, profissão, número de documento de identidade, CPF ou CNPJ, endereço e, quando houver, poderes de representação. Tal precaução demonstra a capacidade civil (art. 104, II, CC), afasta equívocos de legitimidade e confere segurança jurídica às futuras execuções ou notificações.
- Objeto Contratual
A cláusula de objeto descreve, de forma exaustiva, o bem, direito ou serviço negociado, delimitando quantidade, qualidade, especificações técnicas e fins a que se destina. Atende ao requisito de licitude e possibilidade do objeto (arts. 104, I e 482 CC) e reduz o espaço para controvérsias sobre o que efetivamente se contratou.
- Preço, Forma de Pagamento e Reajuste
Deve estabelecer o valor pactuado, a moeda, o cronograma de vencimentos, eventuais descontos, juros moratórios e o índice de correção monetária aplicável, observando o art. 315 do Código Civil. Tal cuidado inibe discussões sobre onerosidade excessiva (art. 478 CC) e facilita a prova do inadimplemento.
- Prazo e Vigência
Esta disposição fixa o termo inicial e final da relação contratual, regras para prorrogação automática e, quando relevante, marcos de execução por etapas. Fundamenta‑se nos arts. 131, 473 e 474 do CC, garantindo previsibilidade e disciplina temporal ao negócio jurídico.
- Obrigações e Responsabilidades
Aqui se distribuem deveres principais e acessórios de cada parte — inclusive padrões de desempenho, prazos de entrega, manutenção ou suporte. Com base nos arts. 389, 395 e 927 do CC, delimita‑se claramente quem responde por perdas e danos em caso de inexecução ou vício do serviço.
- Garantias
Prevê caução, fiança, seguro‑garantia, performance bond ou outras formas idôneas de mitigação de risco, nos termos dos arts. 818‑833 do CC e, quando cabível, art. 66, §3º, da Lei 13.303/2016. A robustez dessa cláusula fortalece o direito de crédito e reduz custos de cobrança. É importante na hipótese de possíveis prejuízos a serem suportados por uma das partes em caso de descumprimento ou execução de forma diversa daquela prevista e desejada.
- Cláusula Penal
A multa compensatória ou moratória antecipa a liquidação de perdas e danos e estimula o adimplemento tempestivo, conforme arts. 408‑416 do CC. A jurisprudência do STJ tem reiterado sua validade quando proporcional e expressamente pactuada. Ela pode ser estipulada, tanto quanto ao atraso no pagamento de valores ou descumprimento de prazos.
- Força Maior e Caso Fortuito
Regula excludentes de responsabilidade, definindo eventos imprevisíveis ou inevitáveis (art. 393 CC) e instituindo procedimento de renegociação ou suspensão contratual. Torna‑se imprescindível em face de cenários como calamidades públicas ou pandemias, hipóteses estas evidentemente, com alto grau de ocorrência.
- Rescisão, Resolução e Distrato
Estabelece hipóteses de extinção antecipada do vínculo, prazos de aviso prévio, indenizações e efeitos da devolução de prestações. Fundamenta‑se nos arts. 474‑479 do CC, fornecendo roteiro seguro para a ruptura contratual amigável ou motivada.
- Confidencialidade
Protege informações estratégicas, segredos industriais e dados pessoais, impondo deveres de não divulgação sob pena de responsabilização. Apoia‑se nos arts. 122 e 422 do CC e nos arts. 7º e 46 da Lei Ger. de Proteção de Dados (LGPD).
- Proteção de Dados (LGPD)
Aloca responsabilidades pelo tratamento de dados, define bases legais, prazos de retenção e protocolos de segurança, em consonância com os arts. 37‑41 da Lei 13.709/2018. Evita sanções administrativas e potenciais danos reputacionais. Prevê, eventual divulgação pública sobre os dados de cada contratante com indevida exposição de quaisquer das partes.
- Propriedade Intelectual
Determina a titularidade de marcas, patentes, softwares ou obras protegidas, bem como licenças de uso e limitações territoriais, à luz da Lei 9.279/1996 e da Lei 9.610/1998. Fundamental para operações que envolvem tecnologia ou conteúdo criativo.
- Índices de Reajuste / Correção Monetária
Prevê o critério de atualização do preço, geralmente atrelado a indicadores oficiais (IGP‑M, IPCA), preservando o equilíbrio econômico e afastando alegações de enriquecimento sem causa (art. 315 CC), permitindo, sobretudo, a recuperação das perdas inflacionárias em determinado período.
- Compliance Anticorrupção e ESG
Impõe deveres de integridade, conformidade com a Lei 12.846/2013 e práticas socioambientais responsáveis, prevendo sanções contratuais para atos lesivos. Reforça a função social do contrato e a boa‑fé objetiva.
- Eleição de Foro
Confere competência territorial (cidade) previamente escolhida pelas partes, nos termos do art. 63 do CPC, facilitando a administração de futuras demandas e evitando discussões processuais sobre lugar de propositura da ação.
- Arbitragem e Mediação
Institui mecanismo extrajudicial de solução de conflitos, definindo câmara arbitral, regras procedimentais e idioma do processo, conforme a Lei 9.307/1996. Proporciona celeridade e confidencialidade à resolução de litígios, especialmente se a contratação envolver agentes de diferentes nacionalidades.
- Notificações e Comunicações
Especifica meios válidos (e‑mail com confirmação de leitura, carta registrada, plataforma eletrônica) e datas de eficácia das comunicações, baseando‑se no art. 726 do CPC. Evita alegações de desconhecimento de fatos relevantes.
- Sucessão, Cessão e Transferência de Direitos
Regula a entrada de herdeiros, cessionários ou adquirentes, condicionando‑a à anuência prévia ou ao cumprimento de requisitos, conforme arts. 286‑292 do CC. Protege contra a assunção involuntária de obrigações.
- Cláusula de Tolerância ou Renúncia
Estabelece que a eventual condescendência de uma parte não implicará novação ou renúncia a direitos futuros (art. 360 II CC). Mantém íntegra a exigibilidade de obrigações mesmo diante de atrasos pontuais.
- Integração e Autonomia das Cláusulas (Severability)
Prevê que a nulidade de uma disposição não afetará a validade do restante do contrato, autorizando sua reforma para preservar a vontade negocial (art. 184 CC). Garante estabilidade estrutural ao pacto.
- Lei Aplicável
Define o ordenamento jurídico que regerá o contrato — nacional ou estrangeiro — em respeito ao art. 9º da LINDB, afastando conflitos de normas e incertezas interpretativas.
- Assinatura Eletrônica e Validade Documental
Reconhece a equivalência jurídica de assinaturas digitais, alinhando o instrumento à MP 2.200‑2/2001 e às boas práticas de certificação. Confere validade probatória e reduz custos operacionais.
Cada uma dessas cláusulas, adaptada ao contexto específico, reflete a autonomia da vontade, a observância dos cânones de boa‑fé, equilíbrio e função social, pilares indispensáveis à eficácia contratual, impedindo eventuais discussões inúteis sobre ocorrências eventualmente não previstas.
Além das cláusulas acima, há inúmeras outras que podem e devem ser observadas especialmente quando se celebram contratos empresarias, hipótese esta que contar com a assessoria de um advogado empresarial é de vital importância, inadmitindo sejam utilizados modelos prontos extraídos da internet ou outras fontes.
Quais as cláusulas típicas de um contrato empresarial?
São elas:
- Cláusula Hardship (onerosidade excessiva superveniente)
Destina‑se a preservar o negócio quando fatos imprevisíveis alteram drasticamente o equilíbrio econômico, obrigando as partes a renegociar condições ou admitir a resolução contratual. Fundamenta‑se nos arts. 478‑480 do Código Civil e na doutrina que trata da “readequação obrigacional”. JusBrasil
- Limitação ou Exclusão de Responsabilidade (“Limitation of Liability”)
Permite às partes fixar tetos indenizatórios ou excluir danos indiretos, desde que não haja dolo ou culpa grave, em harmonia com o art. 393 do CC e o princípio da autonomia privada. A 3.ª Turma do STJ reafirmou sua validade no REsp 1.989.291/DF (julg. 22 fev 2024). - Step‑In Rights
Prevê que, em caso de inadimplemento crítico do prestador, o contratante (ou financiador) possa “assumir” a execução do serviço, direta ou via terceiro, até a regularização da falha. Muito usada em contratos de infraestrutura e parcerias público‑privadas (art. 5.º, §2.º, Lei 11.079/2004).
- Material Adverse Change (MAC)
Autoriza a rescisão ou revisão caso ocorra evento “materialmente adverso” – p. ex., perda súbita de licença essencial, crise cambial extrema ou condenação judicial relevante. Embora de origem anglo‑saxã, é aceita pela doutrina nacional como expressão da boa‑fé objetiva (art. 422 CC) e da alocação prévia de riscos.
- Break‑Up Fee
Estipula compensação pré‑fixada a ser paga se uma parte desistir do negócio antes do closing (muito comum em M&A). A lógica assemelha‑se à cláusula penal (arts. 408‑416 CC), mas a obrigação nasce do simples exercício do direito de “walk away”.
- Tag Along / Drag Along
Em sociedades por ações, assegura‑se que minoritários (tag along) acompanhem a venda do bloco de controle nas mesmas condições ou, inversamente, que sejam obrigados (drag along) a vender a terceiros caso os controladores decidam alienar 100 % do capital. O art. 254‑A da Lei 6.404/1976 positivou o tag along, cuja aplicação foi recentemente discutida no REsp 1.837.538/SP.
- Earn‑Out
Define parcela do preço de compra variável, condicionada a metas de desempenho pós‑aquisição. Garante alinhamento de interesses entre vendedor e comprador, respeitando o art. 317 CC (possibilidade de ajuste judicial se o critério se tornar abusivo).
- Cláusula de “Key Man”
Condiciona a vigência do contrato à permanência de determinado executivo‑chave; sem ele, admite‑se rescisão ou renegociação. Ampara‑se na liberdade contratual (art. 421 CC) e nos deveres de cooperação (art. 422 CC).
- Escrow ou Conta‑Garantia
Parte do pagamento fica retida em conta vinculada até o cumprimento de condições (ex.: quitação de passivos ocultos). Fundamenta‑se no art. 168 CC (depósito) e integra práticas de mitigação de risco em operações societárias.
- Cláusula de “Clawback” (reversão de benefícios)
Autoriza o contratante a exigir devolução de valores pagos, bônus ou participações caso se descubra fraude, erro contábil relevante ou violação de dever fiduciário. Deriva da boa‑fé objetiva e do art. 884 CC (vedação ao enriquecimento sem causa).
- Lock‑Up / Non‑Transfer
Restringe a cessão de quotas ou ações por prazo determinado após a operação, preservando estabilidade societária. Encontra amparo no art. 286 CC (restrições convencionais à cessão de créditos).
- Waiver de Sub‑Rogação em Seguros
A segurada renuncia ao direito de regressar contra determinada parte (p. ex., fornecedor estratégico). Válida desde que expressa e sem fraude (art. 757 CC), consolidada pela jurisprudência do STJ em casos de transporte marítimo e aeronáutico.
- Cláusula de Melhor Esforço (“Best Efforts”)
Obriga o devedor a empregar grau definido de diligência para alcançar determinado resultado incerto. Ajusta‑se às obrigações de meio (arts. 391‑393 CC) e exige parâmetros mensuráveis para evitar discussões quanto ao adimplemento.
- Poison Pill
Prevê gatilhos de diluição ou elevação de preço de aquisição para desestimular tomada de controle hostil, inspirada no direito societário norte‑americano, mas compatível com o art. 109, §1.º, Lei 6.404/1976, desde que aprovada em assembleia.
- “Shotgun” ou Direito de Compra Forçada
Em impasses societários, qualquer sócio pode oferecer preço por todas as ações; o destinatário escolhe vender ou comprar pelo mesmo valor. Trata‑se de mecanismo de solução de deadlock, baseado no princípio da liberdade de contratar (art. 425 CC).
16. Take Or Pay
O compromisso take or pay impõe ao contratante a obrigação de pagar por um volume mínimo de bem ou serviço, ainda que não o consuma integralmente. Trata‑se de mecanismo típico de contratos de longo prazo (energia, gás, infraestrutura), destinado a viabilizar investimentos intensivos de capital e repartir riscos de demanda. O Superior Tribunal de Justiça reconhece sua validade quando pactuada entre partes com poder de barganha e desde que não se revele abusiva; v.g., AgInt no AREsp 2129093/RN, em que a Quarta Turma reiterou a legitimidade da cláusula, afastando a tese de onerosidade excessiva
17. Cláusula Most‑Favored Nation (MFN)
Garante a uma parte o direito de obter condições tão vantajosas quanto as que o contratante conceder a terceiros futuros. Muito utilizada em contratos de distribuição, licenciamento de tecnologia e fornecimento de insumos, a MFN previne discriminações comerciais e preserva a competitividade da contratante. Seu suporte jurídico repousa nos arts. 113 e 422 do CC (interpretação conforme boa‑fé) e no princípio da isonomia negocial.